A grande vilã (da TV) morre hoje. Antes da ceia
Vale tudo. O que todo o país esperava, finalmente vai acontecer: a maior vilã da história do folhetim eletrônico, Odete Roitman (Beatriz Segall), partirá desta pra melhor com três tiros fulminantes, disparados por um revólver ainda sem dono. Ela deveria ter sido eliminada ontem, mas como boa perua, resolveu morrer de véspera. E que véspera melhor do que a de Natal? Com o cadáver de Odete estirado na sala de jantar, os brasileiros poderão enfim se dedicar à ceia natalina - reprodução cristã da Santa Ceia de Jesus com seus apóstolos - e terão assunto para encarar a madrugada inteira.
Afinal, é um capítulo de conjecturas: todos os personagens desfilam seus suspeitos. E curioso que num país onde poucos crimes são solucionados - basta lembrar que hoje faz um ano que o diretor de teatro Luiz Antônio Martinez Corrêa foi barbaramente assassinado sem que o criminoso tenha sido identificado judicialmente - o esporte nacional passe a ser "quem matou Odete Roitman". Como na ficção vale tudo, a espera será pequena: dia 6 de janeiro, o brilhante delegado Arnaldo nos dará a resposta.
É verdade que no vale-tudo da vida real, a inflação prosseguirá galopante, as ruas permanecerão esburacadas, as câmaras municipais continuarão repletas de vereadores cheios de assessores, o futebol seguirá um antro de politicagem. Mas nem tudo está perdido. A Vale tudo da ficção nos redime, embora o capítulo de hoje seja mais morno que peru requentado no dia 25. Ele trata apenas das repercussões e do drama de consciência que se instala na cabeça dos inimigos de Odete: todos, agora, descobrem que ela não era tão má assim.
Todas as pesquisas de opinião realizadas até hoje demonstram que a imensa maioria do povo brasileiro quer a cabeça de Odete, incluindo a própria atriz que interpreta o personagem. No Natal da crise, este é o único presente capaz de elevar o ânimo dos videomaníacos: logo após o Jornal Nacional, a mulher que foi capaz de envenenar a maionese da firma de Raquel, incriminar a própria filha como homicida culposa do irmão Leonardo, induzir Ivan (Antônio Fagundes) a enveredar pelo caminho da corrupção e não pagar a URP dos seus funcionários será eliminada fisicamente.
Nada sutilmente, os autores (Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Basseres) já arrolaram os principais suspeitos: Marco Aurélio, Cézar e Maria de Fátima, cada um com um motivo afetivo/financeiro diferente. Raquel, Ivan, Afonso (Cassio Gabus Mendes), Heleninha e Bartolomeu (Cláudio Corrêia e Castro), entretanto, não podem ser descartados (afinal, quem manda é o marketing e não a lógica da narrativa). Feliz Natal, espectadores.
Jornal do Brasil
24/12/1988
Hoje, às 23:45, bate-papo com o editor do blog, Jean Cândido pela twitcam. Para participar, acesse o twitter @valetudonoviva
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